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O processo grupal no espaço escolar

O processo grupal no espaço escolar
Filipe Alves
nov. 5 - 6 min de leitura
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O processo grupal é um conceito extremamente amplo e complexo, apesar de parecer algo corriqueiro. No dia a dia, nos deparamos com inúmeras situações que nos fazem agir de acordo ou em oposição a determinada organização social. Todas essas interações, sejam elas positivas ou negativas, nos incluem na rede que nos compõe como sociedade.

Porém o grupo, visto como tal, não deve ser limitado pela simples visão agregadora, como uma soma de indivíduos. Mas, ao contrário, usando dos princípios da Gestalt, um agrupamento toma uma forma própria, única, independente da individualidade de seus membros integrantes.

Grupos operativos

Uma das descobertas do psiquiatra argentino Pichon-Rivière foi a teoria dos grupos operativos. Nesse tipo de grupo, ao invés de serem formados com foco na personalidade individual, a formação e coesão do grupo se dá por meio da tarefa que os membros compartilham e pelo objetivo comum que todos pretendem alcançar em conjunto.

Outra característica importante dos grupos operativos é o surgimento de "porta-vozes" de dores e problemas de dentro para fora do grupo, como sintomas de uma doença que emergem do corpo, sinalizando alguma enfermidade. Os grupos, portanto, devem ser vistos como uma unidade que manifesta seus desejos e aflições, assim como um organismo vivo.

Grupos no ambiente escolar

Pensando nessa complexidade intrínseca ao processo grupal, é na escola que geralmente temos a primeira experiência de formação e inserção dentro de grupos. Seja na formação de turmas imposta pela organização de séries e anos, seja por escolha individual, o processo é plenamente visível.

O grupo escolar, quando visto como um organismo único, pode revelar as reais necessidades e dar ao responsável (professor, monitor, educador) uma visão holística sobre o processo de ensino e aprendizagem daquela unidade. Por vezes, "porta-vozes" da turma podem revelar, por meio de atitudes e reações, alguns sinais ou sintomas do problema que a turma enfrenta como um todo.

A visão individualizada, como, por exemplo, o tratamento e rotulação dados a "alunos-problema", nessa abordagem, deve ser evitada a fim de manter a unidade do organismo grupal. As ideias, proposições, dúvidas, dores e reclamações que surgirem dentro daquele agrupamento devem ser tratadas como características vindas não do porta-voz das informações, mas como manifestações geradas pela interação interna e orgânica do grupo em si e consigo mesmo.

Para o bom funcionamento da dinâmica do grupo operativo, a relativização do papel do docente também é de fundamental importância. Citando o psiquiatra e psicanalista argentino José Bleger

"Não se pode pretender organizar o ensino em grupos operativos sem que o pessoal docente entre no mesmo processo dialético que os estudantes, sem dinamizar e relativizar os papeis e sem abrir amplamente a possibilidade de um ensino e uma aprendizagem mútua e recíproca."

É por meio da inclusão do professor como ser incompleto, despido do papel e do status frequentemente associados a ele, que o processo de indagação por parte dos membros do grupo progride. O abandono da presença onipotente do "detentor do conhecimento" faz com que a humanização permeie no grupo, fomentando assim a problematização de questões, o pensamento crítico e a busca por soluções inovadoras e não ortodoxas.

Grupos operativos na prática

Segundo a minha experiência pessoal como observador do processo grupal em ambiente escolar, a teoria pichoniana pode ser observada na prática com nitidez.

Um episódio que posso usar para exemplificar a manifestação do pensamento do grupo por meio de um porta-voz se deu quando uma educadora, recém-chegada na escola em que iria atuar, encontrou resistência por parte dos alunos e um deles, em particular, expressa essa desaprovação verbalmente. A professora não reagiu inicialmente às provocações, mas chamou o aluno provocador para uma conversa em particular e, depois, expôs o problema ao restante dos alunos, também se dispondo a resolver quaisquer questões que surgissem entre eles daquele ponto em diante.

Esse exemplo mostra como o pensamento do grupo pode se manifestar por meio de um indivíduo, podendo levar à interpretação errada de que o descontentamento com a mudança tem origem e existe apenas naquele membro do grupo de forma isolada. A atitude tomada pela professora nesse caso mostra que o entendimento de que a origem dos problemas se dá no grupo como um todo pode ser uma ferramenta positiva na hora de lidar com eventuais conflitos. Também a postura de estar aberta a críticas foi essencial para não haver uma ruptura por conta do desequilíbrio de poder que poderia ser demonstrado por uma postura rígida e inquestionável por parte dela.

Conclusão

Para concluir, gostaria de destacar que esta exposição é apenas uma pequena parte do que os estudos de processos grupais têm a oferecer para a área da educação. É também um convite para a exploração e para um maior desenvolvimento deste tema tão vasto e fértil a todos que tem propostas que possam trazer mudanças significativas para a educação no contexto atual.

Referências

BLEGER, José. Temas de psicologia: Entrevista e grupos. 4 ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011.

PICHON-RIVIÈRE, Enrique. O processo grupal. 8 ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.

CASTANHO, Pablo. Uma introdução aos grupos operativos: teoria e técnica. São Paulo: Vínculo – Revista do NESME, 2012.


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