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A flor que rompe o asfalto: desafios e oportunidades do ensino remoto

A flor que rompe o asfalto: desafios e oportunidades do ensino remoto
Daniela Degani
abr. 16 - 6 min de leitura
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Falar em ABC na escola pode ser uma forma de se referir à alfabetização. Mas, quando essas três letrinhas estão ligadas à meditação e ao mindfulness, elas ganham outro significado: Atenção, Bem-estar e Compaixão. Quem já está familiarizado com o mindfulness no ambiente escolar sabe: esses três elementos, tão importantes para o desenvolvimento dos alunos, podem ser cultivados a partir de práticas muitas vezes simples, que melhoram a atenção, criam uma sensação de bem-estar e incentivam a compaixão.

Estar atento às questões emocionais é fundamental, pois elas interferem no aprendizado. Um ambiente inseguro e instável pode levar o aluno a não desenvolver todas as suas potencialidades adequadamente. Por isso, é impossível pensar em aprendizado sem levar-se em conta os aspectos emocionais e de relacionamento dos alunos.

Quando a pandemia chegou – e lá se vai um ano – muito do que entendíamos por um ambiente seguro e acolhedor, capaz de levar os alunos a se desenvolverem plenamente, teve de ser deixado de lado. Claro que estar em casa, ao lado dos pais, pode ter seus aspectos positivos. Mas a pandemia trouxe também inúmeros desafios.

Adaptações

Quando o ensino remoto passou a ser necessário, uma grande adaptação teve de acontecer. O que antes era cotidiano teve de ser transformado. Ensinar os conteúdos pela tela de computadores e celulares exigiu grande empenho dos educadores e também dos alunos. Para os menores, o impedimento de estar com outras crianças, de se relacionar com pessoas da mesma idade e de socializar foi impactante.

Um dos grandes desafios dos educadores nesse contexto foi criar um ambiente acolhedor e manter os alunos atentos no ambiente virtual. De repente, ficou mais claro do que nunca: não basta saber e ser capaz de ensinar línguas, matemática, ciência ou artes. Durante a pandemia, nem todo o conteúdo pôde ser ensinado em sua totalidade. Afinal, os alunos estão sob estresse, sentem incertezas, muitos passam por luto e os próprios professores precisam se adaptar à nova realidade. Mas, se o conteúdo programático sofreu, outro lado de ser educador ganhou ainda mais importância: apoiar alunos a lidarem com toda essa insegurança. Para isso, foi fundamental saber sobre relações humanas para poder dar conta desse novo modelo online.  Foi preciso um novo ABC: Atenção, Bem-Estar e Compaixão.

Desafio para mestres

O professor, essa presença marcante que mediava a aquisição de conhecimento, passou a ser um rosto na tela. Ficou mais difícil conectar-se com os alunos, muitas vezes sem a câmera ligada, dispersos, angustiados (sem saberem exatamente por quê). E, neste último ano, foi possível criar uma pequena lista com situações pelas quais quase todos – senão todos – os educadores passaram:

  • Necessidade de transportar o formato de ensino para o ambiente virtual
  • Dificuldade de criar uma conexão verdadeira com os alunos e de atrair a atenção deles
  • Esgotamento e estresse
  • Incertezas e falta de previsibilidade para responder a questões sobre a volta à “normalidade”
  • Lidar com medo, insegurança e até com o luto dos alunos.

Desafio para pais

Enquanto isso, os pais passaram a ter um papel ativo no cotidiano escolar, presenciando seus filhos durante o processo de aprendizado, algo inédito até então. Afinal, por mais que um pai ou mãe fosse presente na vida escolar, quando o filho entrava porta adentro na sala de aula, os detalhes do que acontecia ali faziam parte de outro grupo: o dos colegas e professores. De repente, muitos pais e mães se viram diante da necessidade de assistir às aulas com seus filhos, enfrentando, também os pais, situações inéditas:

  • Sentir-se na obrigação de ser “professor” do filho e responder a todas às dúvidas teóricas;
  • Acreditar que é responsável por manter a atenção da criança durante as aulas;
  • Lidar com home office, educação à distância, tarefas domésticas e confinamento – tudo ao mesmo tempo;
  • Não conhecer seu real papel nessa engrenagem;
  • Não perceber que ajudar na organização prévia dos estudos e esforçar-se para ajudar a manter a rotina já será uma imensa contribuição;

Um novo ABC

Com tantas novidades para lidar, alunos, pais e professores precisam estabelecer um novas saídas para lidar com os desafios impostos pela pandemia. Isso passa  por ressignificar o seu papel dentro do contexto escolar, entender que o outro também tem suas fragilidades e criar um ambiente onde todos se sintam acolhidos em suas necessidades.

Nesse contexto, para solicitar Atenção foi preciso aprender a fazer pausas mais frequentes, criar estratégias e mecanismos originais para transmitir o conhecimento. Além disso, nunca foi tão importante perguntar, generosa e sinceramente, “como você está?”. Ouvir a resposta passou a ser não apenas importante para o aluno que fala de si, mas passou a significar uma possibilidade de experiência coletiva em tempos de isolamento, de cultivar o Bem-estar, apesar de tudo. Quando os alunos ouvem-se uns aos outros, eles se conectam. Já a Compaixão passou a ser uma qualidade para ser exercitada diariamente.

Nesse “novo normal”, uma coisa parece certa: tanto para pais, quanto para professores e alunos, o desafio é enorme. E, para poder superá-lo, é fundamental tentar desenvolver as habilidades do coração, ter um olhar atento e compassivo para o outro. E, se não há receita para isso, um caminho possível é, a um só tempo, honrar as dificuldades sem deixar de alegrar o coração. Ou seja: criar formas de encarar de frente a realidade (sem fugir ou “fingir que não está acontecendo”) sem deixar de celebrar os pequenos momentos de alegria, sem esquecer de olhar para o que é belo, de cultivar a generosidade e a amizade. Ou, como escreveu Carlos Drummond de Andrade, sem deixar de notar a flor que rompe o asfalto.

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